domingo, 29 de março de 2015

(Quando os sentidos viajam sem o corpo, é Saudade)

Dizem que olhar não morde. Que o olhar não morde. 
E não morde. Não morde mesmo. 
Mas arranca pedaços. Se arranca!
Leva pessoas, aos pedaços, pedaço por pedaço, 
deixando corpos que passam a ser só corpos – sem os sentidos.
O teu olhar arranca-me, aos pedaços, pedaço por pedaço,
deixando-me assim: só corpo 
– sem o tacto que quer a tua pele,
sem o olfacto que vai para junto do teu perfume,
sem a visão que vai para a frente dos teus olhos,
sem a audição que vai para junto dos teus lábios
e sem o paladar que vai para dentro da tua boca.
O teu olhar não morde. Mas arranca pedaços de mim, um por um.
O teu olhar, aquele teu último olhar, o que me deste quando vim,
ou muito me engano, ou vai-me levar de volta, por inteiro 
– e só falta o corpo – e já falta pouco, 
mas é um pouco que é muito. Quanto mais o tempo passa
mais a falta do teu olhar me arranca daqui. Se arranca! 
[Faltas-me tanto que, pedaço a pedaço, me desintegro,
acreditando que o olhar que me arranca daqui, 
pedaço por pedaço,
é o que me refaz, quando eu voltar.]
(Sérgio Lizardo)




2 comentários:

  1. Não conhecia mas gostei muito. E a imagem escolhida está perfeita :)

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  2. IPC,
    É um poema recente de um autor cá do norte que eu gosto bastante :)
    Sigo-o aqui https://www.facebook.com/sergio.lizardo.escritor

    Tb gostei muito da imagem e achei-a perfeita para este poema :)

    Beijo e uma optima semana

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