segunda-feira, 23 de março de 2015

O Monstro Difuso

Um balanço de toda a Humanidade até aos dias de hoje, que este poeta, (que sem que eu tivesse conhecimento que o fosse) passou hoje pelo meu trabalho para me dar a conhecer este poema, já com 11 anos,  por causa de uma conversa que tínhamos tido…nem tão pouco sabia que este senhor escrevia e quando o li tive curiosidade em pesquisar sobre o autor…e fiquei simplesmente surpreendida!
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O Monstro Difuso

Nascido algures na bruma de outras eras
Diferente eu sou de todas as quimera
De todos os dragões alados do Levante
De olhos sanguíneos e boca flamejante
De todas as serpentes astutas e infernais
De lendas bolorentas e ancestrais
Da Hidra de Lerna de cabeças várias
De todos os mostrengos e todas alimárias
Não sou delírio vão, nem grito de profetas
Nem génio de pintor, nem sonho de poetas
Mas sou realidade... e impossível
Será que exista outra mais terrível
Meus braços, invisíveis e diferentes
De todos os monstros e todos os viventes
São os vossos braços... e vos digo mais
Ando com as pernas com que vós andais
Depois que percorri os séculos um a um
Cheguei enfim aqui... a lado nenhum
Tive pais, padrinhos e parentes
Sou filho de sábios, génios e valentes
Usei chapéu alto e usei gravata
Fui socialista e fui fascista, fui padre e fui pirata
Esclavagista e liberal, anarquista e democrata
Meu nome não importa, minha missão é esta
Sou do mundo a derradeira besta
A Lei morreu, o Ordem se esfumou
E a Nova Ordem é a desordem que eu sou
O Absurdo total, o Crime do mundo
O pântano e a voragem onde me afundo
A miragem doirada de toda a podridão
O Tartufo supremo da Civilização
A tragédia que avança... o lamaçal
A flor sublime da estrumeira global
Em mim paz e guerra são iguais
Dar-vos-ei a que achar que vale mais
E caso valha mais a gente morta
Que morra quem morrer que eu não me importa
Arrancarei olhos, rins e corações
A gente sadia em troca de milhões
E em troca de milhões farei também
A Justiça e a Lei que me convém
Lançarei no lixo o pão que não se come
Enquanto for matando o mundo à fome
A corrupção será sempre o meu estandarte
A minha vida, a minha força, a minha arte
Depois que reduzi o mundo à escravatura
Vos grito a liberdade, o progresso e a fartura
Porque também a própria linguagem
Serve os meus interesses e traz a minha imagem
Mas tudo o que eu prometo é canto de sereias
Porque só a guerra me percorre as veias
Esse monstro que devora os inocentes
São as minhas garras, a força dos meus dentes
É o desespero de um monstro condenado
A morrer matando quem não é culpado
Farei prostitutas e drogados aos milhões
Porque eu próprio sou a droga das nações
Nações que no fundo não passam de utopia
Porque não há fronteiras na minha hegemonia
Sou eu o desespero que cada um transporta
A vida desiludida que já nasce morta
Sou eu o Terrorismo, a ultima invenção
Dos génios do Mercado p`ra minha salvação
Sem terrorismo, anti-terrorismo, fome e guerra
Não poderei eu, um minuto mais, habitar a Terra
Não sou americano, nem árabe nem judeu
Não sou homem-bomba, nem crente, nem ateu
Sou apenas eu, e ninguém mais forte
Poderá deter-me a não ser a morte
Até na paz breve que a vida vos consente
Farei eu morrer milhões de gente
Porque eu sou a morte e não sou a vida
Sou o aborto, o anti-aborto, a pedofilia e a sida
O desemprego e a falência, a insegurança e as prisões
Os Tribunais, o Direito, a Justiça e os Ladrões
E sou ainda na gíria universal
O Iluminismo, a Civilização e a Moral
Sou mil polícias a cada esquina da cidade
Obedecendo cegos à minha vontade
Sou a Democracia e a Modernidade
Sou o dinheiro e o Mercado. Sou o Valor
Não tenho pátria, nem raça, nem cor
Todos os deuses antigos e modernos
Todos os paraísos e todos os infernos
Pobres e ricos, palhaços, presidentes e reis
Têm um valor... e esse Valor são as minhas leis
Nada tenho de humano, sou cego, surdo e mudo
Indiferente à dor, à guerra, à morte, a tudo
Sou o Valor global, real e soberano
Que transforma em besta cada ser humano.

(Leonel Santos - Março de 2004)
 



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